Apesar de competir
com tablets e computadores nas salas de aula, escrita à mão ajuda a fixar mais
dados e é uma ginástica mental poderosa, apontam estudos
Não é uma boa ideia aposentar a tradicional escrita à mão,
com lápis e caderno, como ferramenta didática.
Estudos recentes mostram que tanto as crianças que estão
sendo alfabetizadas quanto adultos podem ter vantagens no aprendizado quando
colocam as palavras no papel, à maneira antiga.
No caso dos pequenos, traçar as letras com lápis e caneta
parece ser uma ginástica mental mais poderosa do que simplesmente procurá-las
num teclado, além de potencializar o aprendizado do vocabulário e ser mais útil
contra problemas como a dislexia. Para os jovens, anotações feitas em cadernos
têm mais potencial para ajudá-los a fixar o conteúdo da aula.
Ler e escrever, em especial do jeito tradicional, são
tarefas cognitivas complexas. É preciso juntar numa única orquestra de
neurônios áreas cerebrais de ação motora, de linguagem e de raciocínio.
Num estudo publicado na revista científica "Trends in Neuroscience and Education",
pesquisadoras observaram o que acontece no cérebro de crianças com idades entre
quatro e cinco anos que estavam começando a ler.
Meninos e meninas foram divididos em três grupos. O primeiro
era ensinado a traçar letras de fôrma manualmente; o segundo cobria uma linha
pontilhada; o terceiro tinha de identificar a letra num teclado de computador.
Depois as crianças foram colocadas em aparelhos de
ressonância magnética e reviam, lá dentro, as letras que tinham praticado.
As imagens de ressonância deram às cientistas uma ideia
sobre o grau de ativação de cada região do cérebro das crianças. Tanto a
diversidade de áreas cerebrais ativadas quanto a intensidade dessa ativação
foram mais acentuadas nos pequenos que tinham sido treinados a escrever as
letras "do zero".
Para os autores, os achados apoiam a hipótese de que a
escrita tradicional ajudaria o desenvolvimento mental infantil, em especial na
capacidade de abstração.
Isso porque a criança precisa conseguir perceber que um
"a" é sempre um "a", por exemplo, independentemente da
letra ou da fonte usada.
O resultado desse processo pode ser percebido em alunos de
universidades. Um artigo na revista "Psychological Science" mostrou
que aqueles que anotavam o conteúdo de palestras à mão retiveram mais da aula
do que os que usaram notebooks.
Ao anotar à mão, o aluno precisa reorganizar os dados da
aula com sua própria lógica, o que o ajuda a entender melhor o que o professor
está explicando.
Segundo Angela de Cillo Martins, coordenadora pedagógica de
educação infantil e do primeiro ano do ensino fundamental do colégio Dante
Alighieri, em São Paulo, a facilidade com que crianças pequenas e até bebês
manipulam tablets e smartphones hoje não tem levado a um desinteresse pela
escrita à mão na fase pré-escolar.
"Nas séries iniciais, o objetivo principal é o contato
constante da criança com a escrita. Para isso, usamos vários recursos, como
computadores, tablets, lousas digitais, folhas avulsas e cadernos", diz
Angela. Embora os alunos do ensino médio recebam tablets, em sala de aula
continuam escrevendo em caderno, de acordo com ela.
"A grande vantagem na alfabetização é que, para as
crianças dessa idade, o ato de escrever está muito associado ao ato de
desenhar, o que incentiva os alunos a manipular o lápis e a caneta", diz
Eloiza Centeno, coordenadora pedagógica de educação infantil do colégio São
Luís.
"Mais tarde, a gente nota uma facilidade maior com o
teclado quando a questão é ter fluência e velocidade para escrever",
conta. "Não acho que seja o caso de usar aqueles exercícios antigos de
caligrafia, mas dá para trabalhar a fluência e a legibilidade na escrita à mão,
até porque é uma habilidade ainda indispensável no vestibular."
Fonte: Jornal Folha de São Paulo, 08/07/2014
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