Sair com a criançada para comer pode enlouquecer qualquer
pai.
Se um adulto não pede folhas, massas insossas e carne
processada, entre outros itens tediosos, por que uma criança deveria?
Enquanto pais têm combinações ousadas de sabores e texturas
à disposição, os filhos parecem destinados a uma comidinha confortavelmente sem
graça –nada desconhecido, miniporções e batata frita quase sempre no pacote.
Saladas e legumes são raridade, ao contrário do que ocorre
com as massas, as frituras e os hambúrgueres.
A Folha levantou 30 menus infantis em
restaurantes de todas as regiões de São Paulo e os submeteu a três
nutricionistas. Cada um selecionou os melhores –e os três foram unânimes na
escolha de quatro casas. Eles também apontaram vilões em alguns cardápios.
Nessa pequena amostra, chama a atenção a falta de
criatividade. "Os menus são monótonos porque consideram que as crianças só
comem alguns tipos de alimento. Nessa visão, a fritura entra com tudo. Como boa
parte das pessoas acha que a gordura melhora o sabor dos alimentos, dá
crocância e um bom visual, consequentemente acredita que a criança vai aceitar
bem algo fritinho", diz a nutricionista Alessandra Coelho, da clínica AC.
"Pode parecer sem graça, carninha e massinha com tomate
ou com arroz e legumes, afinal, isso a criança deveria comer em casa. Mas é,
sim, boa opção, porque as mães hoje não têm tempo de cozinhar e se entregam a
'nuggets', lasanha congelada e hambúrguer", explica Daniel Magnoni,
nutricionista, cardiologista e diretor da Doutor Gourmet, que avalia produtos
das indústrias alimentícia e farmacêutica.
"A falta de verduras e legumes nos menus pode ser
reflexo do que ocorre nas casas: se os pais não estimulam o paladar e
apresentam só esses itens no dia a dia, a criança não vai aceitá-los no
restaurante", diz a nutricionista Cristiane Kovacs, chefe ambulatorial do
Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia.
"Sentindo a falta da educação alimentar familiar, os
restaurantes fazem as apostas menos arriscadas: arroz, macarrão, batata
frita", complementa Alessandra Coelho.
RESTAURANTES SERVEM
MENUS DE FAST FOOD
Giz de cera, quebra-cabeça e canetinha que incrementam os
tradicionais menus kids podem, sim, desviar a atenção da comida, dizem os
especialistas ouvidos pela FOLHA. E, mais, ajudam a vender com facilidade
franguinho empanado, batata frita, hambúrguer e cachorro-quente –receitas que
construíram a fama de cadeias de fast food com quantidades elevadas de
calorias, sódio, colesterol, açúcar e conservantes e que deixaram de se
restringir às lanchonetes.
A fotógrafa Luciana Cristhovam, mãe de Sofia, 6, e Theo, 3,
sente-se incomodada diante desse tipo de oferta para os seus filhos. "Os
brinquedos agradam as crianças, claro, mas acabam tirando o foco dos
pratos", afirma. "Mesmo restaurante que não é 'junk' tem sempre
macarrão ao sugo, não explora um prato do próprio cardápio."
HÁBITOS
De fato, criança pode comer o que adulto come. "Uma
alimentação equilibrada deve ser rotina, principalmente na infância, que é o
período de desenvolvimentos físico e intelectual", diz a nutricionista
Cristiane Kovacs. "É na infância que os hábitos são formados, quando
sabores, texturas e aromas precisam ser provados."
A advogada Maria Isabel C. Bayeux Guedes Nunes, mãe de
Guilherme, 3, e Catarina, 1, sai para comer com os pequenos de três a quatro
vezes por semana e diz não ver um "problema tão grande", quando se
depara com pratos "pobres do ponto de vista nutricional".
"Sair da rotina de vez em quando não faz mal, o mais
importante é eles terem prazer no programa", diz ela. "Mas claro que
seria melhor se tivesse uma variedade maior de pratos, inclusive mais
saudáveis."
EXCEÇÕES
Há exceções, no entanto, que não estão necessariamente
impressas em cardápios: a chef Janaina Rueda, do Bar da Dona Onça, por exemplo,
incentiva as crianças a escolherem meia porção de um prato que lhes chame a
atenção. "Se eu estiver na cozinha, mando à mesa um mexidinho de arroz,
carne e ovo."
No fins de semana, quando o movimento das crianças é maior,
o chef Juliano Valese, do espanhol Torero Valese, coloca na lousa a paella e
aproveita para criar versões personalizadas da receita para elas: só verduras,
franguinho, só camarão...
"Queria servir um prato diferente, gostoso e que não
fosse massa com molho branco. Um prato mais saudável, mediterrâneo, que
conversasse com a minha cozinha. Deixo a mãe ou a criança decidirem o que
querem na receita", conta ele.
Segundo o nutrólogo Daniel Magnoni, não é preciso ser
"xiita". "Lazer é lazer, mas começar com uma salada, evitar sal
em excesso e mesclar carne com legumes pode ser prazeroso. A apresentação tem
de ser atraente e não apenas em sobremesas lindas e cheias de cremes",
arremata.
Fonte: Folha de São Paulo, 16/07/2014
Veja matéria completa:Folha de São Paulo
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