quinta-feira, 17 de julho de 2014

Folha avaliou 30 menus infantis de restaurantes em SP; 97% têm fritura

Sair com a criançada para comer pode enlouquecer qualquer pai.

Se um adulto não pede folhas, massas insossas e carne processada, entre outros itens tediosos, por que uma criança deveria?

Enquanto pais têm combinações ousadas de sabores e texturas à disposição, os filhos parecem destinados a uma comidinha confortavelmente sem graça –nada desconhecido, miniporções e batata frita quase sempre no pacote.

Saladas e legumes são raridade, ao contrário do que ocorre com as massas, as frituras e os hambúrgueres.

A Folha levantou 30 menus infantis em restaurantes de todas as regiões de São Paulo e os submeteu a três nutricionistas. Cada um selecionou os melhores –e os três foram unânimes na escolha de quatro casas. Eles também apontaram vilões em alguns cardápios.

Nessa pequena amostra, chama a atenção a falta de criatividade. "Os menus são monótonos porque consideram que as crianças só comem alguns tipos de alimento. Nessa visão, a fritura entra com tudo. Como boa parte das pessoas acha que a gordura melhora o sabor dos alimentos, dá crocância e um bom visual, consequentemente acredita que a criança vai aceitar bem algo fritinho", diz a nutricionista Alessandra Coelho, da clínica AC.

"Pode parecer sem graça, carninha e massinha com tomate ou com arroz e legumes, afinal, isso a criança deveria comer em casa. Mas é, sim, boa opção, porque as mães hoje não têm tempo de cozinhar e se entregam a 'nuggets', lasanha congelada e hambúrguer", explica Daniel Magnoni, nutricionista, cardiologista e diretor da Doutor Gourmet, que avalia produtos das indústrias alimentícia e farmacêutica.


"A falta de verduras e legumes nos menus pode ser reflexo do que ocorre nas casas: se os pais não estimulam o paladar e apresentam só esses itens no dia a dia, a criança não vai aceitá-los no restaurante", diz a nutricionista Cristiane Kovacs, chefe ambulatorial do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia.

"Sentindo a falta da educação alimentar familiar, os restaurantes fazem as apostas menos arriscadas: arroz, macarrão, batata frita", complementa Alessandra Coelho.

RESTAURANTES SERVEM MENUS DE FAST FOOD
Giz de cera, quebra-cabeça e canetinha que incrementam os tradicionais menus kids podem, sim, desviar a atenção da comida, dizem os especialistas ouvidos pela FOLHA. E, mais, ajudam a vender com facilidade franguinho empanado, batata frita, hambúrguer e cachorro-quente –receitas que construíram a fama de cadeias de fast food com quantidades elevadas de calorias, sódio, colesterol, açúcar e conservantes e que deixaram de se restringir às lanchonetes.

A fotógrafa Luciana Cristhovam, mãe de Sofia, 6, e Theo, 3, sente-se incomodada diante desse tipo de oferta para os seus filhos. "Os brinquedos agradam as crianças, claro, mas acabam tirando o foco dos pratos", afirma. "Mesmo restaurante que não é 'junk' tem sempre macarrão ao sugo, não explora um prato do próprio cardápio."

HÁBITOS
De fato, criança pode comer o que adulto come. "Uma alimentação equilibrada deve ser rotina, principalmente na infância, que é o período de desenvolvimentos físico e intelectual", diz a nutricionista Cristiane Kovacs. "É na infância que os hábitos são formados, quando sabores, texturas e aromas precisam ser provados."

A advogada Maria Isabel C. Bayeux Guedes Nunes, mãe de Guilherme, 3, e Catarina, 1, sai para comer com os pequenos de três a quatro vezes por semana e diz não ver um "problema tão grande", quando se depara com pratos "pobres do ponto de vista nutricional".

"Sair da rotina de vez em quando não faz mal, o mais importante é eles terem prazer no programa", diz ela. "Mas claro que seria melhor se tivesse uma variedade maior de pratos, inclusive mais saudáveis."

EXCEÇÕES
Há exceções, no entanto, que não estão necessariamente impressas em cardápios: a chef Janaina Rueda, do Bar da Dona Onça, por exemplo, incentiva as crianças a escolherem meia porção de um prato que lhes chame a atenção. "Se eu estiver na cozinha, mando à mesa um mexidinho de arroz, carne e ovo."

No fins de semana, quando o movimento das crianças é maior, o chef Juliano Valese, do espanhol Torero Valese, coloca na lousa a paella e aproveita para criar versões personalizadas da receita para elas: só verduras, franguinho, só camarão...

"Queria servir um prato diferente, gostoso e que não fosse massa com molho branco. Um prato mais saudável, mediterrâneo, que conversasse com a minha cozinha. Deixo a mãe ou a criança decidirem o que querem na receita", conta ele.

Segundo o nutrólogo Daniel Magnoni, não é preciso ser "xiita". "Lazer é lazer, mas começar com uma salada, evitar sal em excesso e mesclar carne com legumes pode ser prazeroso. A apresentação tem de ser atraente e não apenas em sobremesas lindas e cheias de cremes", arremata.

Fonte: Folha de São Paulo, 16/07/2014
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