Limpar a casa constantemente, lavar os pratos na máquina e
manter distância da terra do campo influem na saúde de seus filhos
(Baseado na matéria publicada em 15/04/2015, pelo jornal El País/Brasil)
Neste artigo há detalhamento de uma pesquisa realizada na
Suécia, com criança que sofriam de alergias. Os resultados são muito
interessantes para avaliarmos a necessidade de equilíbrio. A limpeza é importante, mas no mundo
moderno chegamos a tal ponto de higienização que acabamos criando problemas de
imunidade. Aqui repassamos alguns trechos, a matéria completa você pode ler no
link ao final da página.
Vistos de longe, os objetivos da pesquisa poderiam parecer
absurdos. Cientistas do departamento de alergologia do hospital de Gotemburgo,
na Suécia, escolheram mais de 1.000 crianças e mandaram uma série de perguntas
a seus pais. Algumas delas buscavam saber se eles sofriam de algumas das
alergias mais comuns: asma, eczema, rinite ou conjuntivite. Até aí, nada de
estranho, considerando a origem de seu interesse. Mas depois perguntaram algo
mais surpreendente aos pais: usavam
máquina de lavar louça ou lavavam os pratos à mão? A pergunta parecia
não fazer sentido, sem falar que as máquinas são mais eficientes na lavagem da
louça.
Mas os pesquisadores tinham partido com uma ideia na cabeça,
e os resultados confirmaram o que eles já intuíam: as crianças que viviam em casas sem lava-louças
tinham aproximadamente metade do risco de sofrer alergias que as crianças das
casas mais modernas. Não apenas isso: o risco diminuía ainda mais se
consumiam alimentos fermentados e se seus pais costumavam comprar alimentos
diretamente de fazendas.
Em outras palavras, as casas extremamente assépticas geravam um efeito
paradoxal: aumentavam a probabilidade de anular as defesas das crianças.
É o que se conhece como “a hipótese da higiene”. E era justamente essa a
premissa inicial dos pesquisadores.
A importância de ter irmãos
A hipótese da higiene nasceu em 1989. Nesse ano, o
epidemiologista inglês David P. Strachan, depois de estudar mais de 17.000
crianças, concluiu que o fator que mais protege as crianças contra sofrer de
rinite alérgica é simplesmente ter irmãos maiores. Uma das melhores definições
da suspeita aparece no final desse estudo: “O aparente aumento das doenças alérgicas poderia ser
explicado se elas foram prevenidas por infecções na primeira infância,
transmitidas por um contato pouco higiênico com irmãos maiores ou adquiridas
antes de nascer. Ao longo do século passado, a redução do tamanho das famílias,
o aumento das conveniências no lar e a elevação dos padrões de higiene pessoal
reduziram as possibilidades de as infecções serem transmitidas na família. Isso
pode ter propiciado o aumento das manifestações clínicas das alergias.”
.......
Um conjunto de defesas
O mecanismo parece residir na proporção de nossas defesas. Entre
o exército de células que nos protege estão os linfócitos, as células que
produzem anticorpos. Mas nem todos os linfócitos têm essa função. Como os
escalões no exército, também aqui os papéis são divididos. Alguns, os chamados
“colaboradores”, participam regulando a batalha; eles atuam de certo modo
coordenando as respostas.
Entre eles, também há dois grupos diferentes. O
primeiro reage sobretudo contra vírus e bactérias. O segundo tende a se dirigir
principalmente contra outros parasitas, como os vermes, de modo que essa
resposta se parece muito com a das reações alérgicas. O que se viu é que as crianças que viviam em
ambientes mais “limpos” tinham mais linfócitos que o normal do segundo grupo e,
por isso, tendiam a ter mais alergias. De alguma maneira, o contato precoce com
os microorganismos “treinava” o exército imunitário para ter as proporções
corretas em cada divisão.
...
Para esse especialista, o artigo sobre o uso de lava-louças
é um estudo simples, não um trabalho chave, “mas representa mais uma peça que
se encaixa no quebra-cabeças”. Alguns cientistas, porém, questionam se a
hipótese da higiene é realmente tão ampla e importante quanto se sugere que
seja. Eles se agarram a fatos como a diminuição da proporção de asmáticos em países
desenvolvidos, sem que isso seja acompanhado de uma redução nas medidas de
higiene. Guarner discorda.
“O que vemos é que, de modo geral, os índices de asma continuam a subir. E já
se confirmou que inclusive migrantes de países pobres para países mais desenvolvidos
passam a ter maior risco de alergias e doenças autoimunes.”
Em busca do meio termo
O microbioma é o conjunto de microorganismos que nos povoam
constantemente sem nos causar nenhum tipo de dano. E esses microorganismos não
são poucos. Para cada célula humana temos até dez bactérias, cumprindo funções
das mais diversas, e muitas vezes fundamentais. Entre elas está precisamente o
treinamento do sistema imunológico. Mas estamos pouco a pouco perdendo a
diversidade. “A introdução
dos antibióticos e de novos métodos de esterilização fez com que hoje estejamos
colonizados principalmente pelos microorganismos mais resistentes”,
explica Guarner. “O sistema de defesa evoluiu para identificar e reconhecer
aquelas que eram velhas amigas, mas agora ele se equivoca muito mais e se
tornou mais intolerante.”
Isso
não quer dizer que seja preciso renunciar a todos os avanços de higiene
conquistados. “Por isso não gostamos do nome de ‘hipótese da higiene’”,
observa Guarner, “porque evitar as patologias obviamente não é algo negativo.
Não devemos retroceder.” Então como combinar as vantagens de ambos os mundos?
Uma possibilidade que vem sendo estudada é tomar probióticos, organismos que
melhoram a diversidade perdida. Mas ainda estamos muito distantes de uma
solução. Enquanto isso, Guarner
aconselha “não abusar da esterilização quando não houver um foco patógeno na
família” (isso significa que, enquanto não houver um doente em casa, não é
necessário lavar os têxteis com alvejante –com sabão e por motivos estéticos é
o bastante- nem ferver as chupetas dos bebês). Guarner acrescenta algo
que quase todo o mundo reconhece intuitivamente: “Convém aumentar o contato com a natureza”. Sujar-se no
campo fortalece a saúde.
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